José Fernando Pacheco Coimbra nasceu a 22 de Março de 1939 no Porto.
Os pais chamavam-se José Pinheiro Coimbra e Ana da Rocha Pacheco mas, após a morte do pai, foi a madrinha e tia quem a criou.
Da sua juventude recorda as idas ao cinema com os antigos amigos e as festas para onde ia dançar com as raparigas. Eram tempos difíceis “não tinha dinheiro para o fixador e um dia qualquer pus água com açúcar no cabelo. E ficava porreiro. O pior era a dançar ao ar livre, com as moscas, era eu a dançar e a sacudir as moscas.”
Trabalha desde os 11 anos no comércio e actualmente é o proprietário da Magic Moda Jovem, no passado conhecida por Fogueira das Meias.
Com 11 anos comecei a trabalhar em Fernandes Tomás numa casa que se chamava Casa dos Bordados. Depois foi Casa dos Linhos que ainda hoje existe.
Estive lá dos 11 até aos 19. Portanto mal pago, explorado. Era assim naquele tempo. Eu lembro-me que tive uma lesão pulmonar aos 16 anos. E o patrão disse:
- “Convém descansar.”
Mas quando precisou de mim:
- “Convinha já vires trabalhar.”
O meu primeiro salário foi zero. Eu estive três meses sem ganhar um tostão.
Era assim antigamente. E dizia o meu patrão.
- “No meu tempo ainda tínhamos que pagar.”
Essa casa fornecia os colégios de freiras. Aqui o Nossa Senhora do Rosário, Colégio da Paz, os colégios que havia aqui. Era curioso que tinha uma ordem que era importante. Não se podia olhar para as meninas naquela altura. Eu via as meninas lá nos balancés, mas eu sempre com os olhos no chão. Tinha que ser, era a técnica. Na rua quando tinha um recado ou qualquer coisa andava sempre a ver e a aprender.
Depois aí aos 19 anos é que dou o salto contra a vontade dos meus tios. Porque naquele tempo era:
- “Ó senhor fulano se for preciso dar-lhe um estalo dê um estalo.”
Isto eu tinha 11 anitos. E é verdade que eu logo nos primeiros tempos levei um estalo e fez-me bem. Ao outro meu colega mandaram-no embora e eu fiquei com o estalo e pronto. Tinha feito asneira grande na altura. Já não me lembro qual foi a asneira. A minha madrinha:
- “Ei, vê se te portas bem.”
Aquelas coisas como era antigamente. Hoje é o inverso, se patrão faz queixa do funcionário está tramado.
Aos 19 anos decidi e tinha que sair. Lá está, naquela altura os agentes de emprego eram os vendedores que andavam na rua. Esses é que conheciam o mercado. Sabiam que aquele era razoável, aquele era bom, aquele não sei que mais. Falei-lhe e ele disse-me:
- “Vais ali à Rua Trindade Coelho ao Artur Dias de Almeida. Vais a meu mando.”
Ele já tinha falado em mim. Fui falar com o senhor Almeida, quanto é que ganha, quanto é que não ganha. Eu disse que ganhava 500 escudos. Deu-me 900 escudos. Naquela altura foi um salto muito bom. Contra a vontade dos meus tios.
- “Tu vais ver, tu estás tramado. Qualquer dia vens para a rua. Tu és um malandro.”
Eu era malandro de facto. Dei o salto e foi a minha sorte. Já com aquela ameaça da minha família que eu ia falhar, critica que foi positiva e motivadora.
Aquilo não era “tudo ao monte e fé em Deus“. Era uma casa com um movimento brutal. Eram quatro andares e era uma coisa muito competitiva. Os clientes eram muitos naquela altura. O balcão era comprido, um balcão enorme e aquilo não parava. Eu sei que no primeiro dia eu queria sair à noite e não podia. No segundo não podia. Mas tanto dei o máximo que passado um ano já estava com 1100 salvo erro, depois já estava com 1200. Tive a sorte que o gerente dessa firma que era o senhor Nelson se quis estabelecer e convidou-me para ir com ele.
O Artur de Almeida ainda hoje digo foi um homem que é um exemplo do que deve ser um patrão. Ele chegava ao trabalho pegava no coração metia-o na gaveta. Não fumava um cigarro, não fumava à nossa frente. Às sete horas voltava a pôr o coração e já era espectacular. E isso foi uma escola para mim. Lá me despedi:
- Senhor fulano e tal, peço desculpa mas fulano assim-assim…
E ele diz-me assim:
- “Não conhece ninguém que queira vir para cá?”
- Eu conheço um colega meu lá na loja onde trabalhei.
Passado uns tempos, antes de chegar ao fim do mês, ele chama-me outra vez:
- “Olha ó senhor fulano, o seu colega como é que ele é?”
- É jeitoso, é bom.
- “E o senhor vai mesmo embora? Olhe o senhor não vai. Não vai porque eu perguntei ao senhor Nelson – que era o gerente – ele falou comigo e perguntou-me se eu não me importava que o senhor fosse trabalhar com ele. Pois eu importo-me. O senhor não vai.”
Eu fiquei a olhar para ele. Não exigi nada, só sei que me aumentou mais.
Também o factor sorte é importante nisto. E pronto, fui evoluindo, evoluindo até que enfim à terceira tentativa consigo sair, mas mal. Não devia ter saído, hoje reconheço. Porque esta casa estava falida na altura e eu não sabia. Foi um filho do viajante da firma que me tinha convidado para tomar conta de uma loja. Eu acreditei e quando alguém me diz:
- “É pá aquela casa está assim-assim.”
Eu já não tive coragem de dizer ao Artur de Almeida:
- Senhor fulano, eu fico.
Não sei se fiz bem, se fiz mal. Eu tinha-me despedido ao sócio dele.
- “Lamento que o senhor se tenha despedido aproveitando a minha ausência.”
Depois vim para aqui. Tive muitas dificuldades na altura. Era inexperiente.
Sabia o que o cliente queria, tinha agilidade, era rápido porque vinha de um ritmo totalmente diferente, vinha com a ameaça que eu ia falhar, isso foi uma ajuda.